Haitham Al Ghais tornou-se secretário-geral da OPEP em 2022. Ele atuou como governador da OPEP do Kuwait de 2017 a 21 e foi presidente inaugural do Comitê Técnico Conjunto da OPEP+ em 2017. Al Ghais já era um veterano do setor de petróleo e gás, tendo ocupado cargos seniores nos principais órgãos e comitês da OPEP e da OPEP+, bem como na Kuwait Petroleum Corporation.
Nas décadas de 1990 e 2000, eram muito comuns matérias jornalísticas dedicadas à teoria do pico no fornecimento de petróleo, reforçada por vozes como Colin Campbell e Matthew Simmons. Décadas depois, no entanto, ela ainda não se concretizou, com os constantes progressos na economia e na tecnologia tendo ajudado a reduzir os custos e abrir novas fronteiras para expandir a base de recursos.
Os últimos dez anos, aproximadamente, testemunharam uma mudança no discurso sobre o pico na demanda por petróleo, com alguns analistas defendendo cada vez mais cenários teóricos que afirmam, antes da análise de qualquer dado, que o petróleo não deve fazer parte de um futuro energético sustentável.
Isso fica claro em alguns cenários de net zero, com sugestões de que a demanda por petróleo atingirá o pico antes de 2030 ou, de forma mais dramática, que a demanda por petróleo cairá mais de 25% até 2030, junto com apelos para que se pare de investir em novos projetos de petróleo.
Essa narrativa foi repetida ontem mesmo, quando a AIE publicou seu relatório Oil 2024, no qual afirmou mais uma vez que a demanda por petróleo atingiria o pico antes de 2030. Esse comentário é perigoso, principalmente para os consumidores, e só contribui para a volatilidade energética em uma escala possivelmente sem precedentes.
Também já se ouviu narrativas parecidas antes. Narrativas que se mostraram erradas. A AIE sugeriu que a demanda de gasolina havia atingido o pico em 2019, mas o consumo de gasolina atingiu níveis recordes em 2023 e, de fato, continua a aumentar este ano. A Agência também afirmou que a demanda por carvão havia atingido o pico em 2014, mas o consumo de carvão continua atingindo níveis recordes atualmente.
Muitos futuros net zero se concentram quase que exclusivamente na substituição de hidrocarbonetos, que compõem mais de 80% da matriz energética global atualmente. Em vez de se adicionar novas fontes de energia à matriz, o foco está na substituição de fontes, o que vai contra a história do fornecimento de energia ao mundo. A ênfase está na retórica em detrimento da realidade, na restrição em detrimento da escolha do consumidor.
Atualmente, a energia eólica e a energia solar representam cerca de 4% da energia global, e os veículos elétricos (VEs) têm uma taxa de penetração global total entre 2% e 3%, embora o mundo tenha investido mais de US$ 9,5 trilhões em “transição” nas últimas duas décadas. A OPEP recebe de braços abertos todo o progresso feito nas áreas de energias renováveis e veículos elétricos, mas ele não é nem de longe suficiente para substituir 80% da matriz energética. Além disso, as redes de eletricidade, a capacidade de fabricação de baterias e o acesso a minerais essenciais continuam sendo grandes desafios.
Devemos lembrar também que o desenvolvimento de energias renováveis e veículos elétricos requer alguns produtos relacionados ao petróleo. Sua expansão futura aumentará a demanda por petróleo.
É claro que todos queremos reduzir as emissões, mas, ao mesmo tempo, precisamos de um fornecimento de energia amplo, confiável e acessível. As duas coisas não podem ser dissociadas. Nosso futuro energético deve, portanto, se concentrar no quadro completo e não em um quadro parcial e incompleto. A esse respeito, vale a pena ter em mente três fatos importantes.
Primeiro, o crescimento futuro da demanda por energia e petróleo está principalmente no mundo em desenvolvimento não integrante da OCDE, impulsionado pelo aumento da população, pela expansão da classe média e pelo crescimento das economias. De agora até 2045, a demanda por petróleo fora da OCDE deverá se expandir em mais de 25 milhões de barris por dia (mb/d), só China e Índia contribuindo com mais de 10 mb/d.
Devemos lembrar também que bilhões de pessoas no mundo em desenvolvimento ainda não têm acesso a serviços modernos de energia. Para essas pessoas, seu futuro energético não se resume ao net zero, a decidir sobre a compra de um veículo elétrico ou a refletir sobre os custos e benefícios das fontes de energia. Trata-se, na verdade, de conseguir o básico de energia que o mundo desenvolvido tem como certo, como poder acender uma luz, cozinhar em um fogão limpo ou ter transporte motorizado para ir e voltar do trabalho ou da escola.
Em segundo lugar, a demanda por petróleo continua a aumentar. Na OPEP, vemos um crescimento da demanda por petróleo de 4 mb/d nos dois anos de 2024 e 2025, e outros analistas também veem uma expansão de mais de 3 mb/d. Até mesmo a AIE prevê um crescimento de 2 mb/d nesse período, seguido por um crescimento de 0,8 mb/d em 2026. Depois, o crescimento cai drasticamente para quase nenhum crescimento nos próximos quatro anos até 2030.
Esse não é um cenário realista, e apresenta um impacto negativo sobre as economias do mundo todo. É simplesmente uma continuação da narrativa antipetróleo da AIE. Considerando as tendências reais que observamos hoje, não vemos um pico na demanda por petróleo até o final da década.
Em terceiro lugar, muitas partes do mundo estão testemunhando uma resistência dos consumidores à medida que as populações compreendem as implicações de agendas políticas ambiciosas e irrealistas de net zero. Isso, por sua vez, está fazendo com que os políticos reavaliem suas abordagens em relação aos futuros caminhos energéticos, por exemplo, no Reino Unido, onde o governo recentemente apoiou novas licenças de petróleo e gás.
Essas mudanças, juntamente com os desenvolvimentos no cenário econômico, fizeram com que a OPEP revisasse para cima suas expectativas de demanda de petróleo para 116 mb/d até 2045, e há espaço para que esse nível seja ainda maior. Não prevemos um pico na demanda por petróleo em nossa previsão de longo prazo.
Em relação à oferta, os avanços tecnológicos estão nos permitindo adicionar continuamente recursos à base para ajudar a atender ao crescimento da demanda. É inegável que há recursos suficientes para este século e para os próximos, já que as reservas mundiais comprovadas de petróleo bruto são de mais de 1,55 trilhão de barris. Além disso, as tecnologias também estão nos permitindo dar grandes passos na redução das emissões, como exemplificado pela disponibilidade de combustíveis mais limpos, maior eficiência e tecnologias como captura, utilização e armazenamento de carbono, remoção de dióxido de carbono e captura direta do ar.
Todos podem ter sua opinião, mas é importante que ela se baseie nas realidades que temos diante de nós hoje. A necessidade é clara de priorizar a segurança energética, utilizar todas as fontes de energia disponíveis, tornar a energia acessível, aumentar a sustentabilidade, reduzir as emissões e não limitar nossas opções de energia diante da demanda crescente.
O petróleo pode atender a todas essas necessidades e, quando olhamos para o futuro, é a própria versatilidade do petróleo que garante que não veremos o pico na demanda por petróleo tão cedo. Assim como o pico de fornecimento de petróleo nunca aconteceu, as previsões de pico na demanda por petróleo seguem uma tendência semelhante.
Diante desse cenário, as partes interessadas precisam reconhecer a necessidade de investimentos contínuos no setor de petróleo hoje, amanhã e por muitas décadas no futuro, uma vez que os derivados do petróleo bruto são essenciais para nossa vida cotidiana. Quem fecha os olhos para essa realidade está plantando a semente para futuras carências de energia e maior volatilidade, e abrindo a porta para um mundo em que a lacuna entre os “que têm energia” e os “que não têm energia” aumenta cada vez mais.