As contribuições dos combustíveis renováveis para a descarbonização da economia foram discutidas por especialistas em evento promovido pelo IBP
Apesar de possuir uma matriz energética com elevada participação de fontes renováveis, o Brasil tem compromissos a cumprir para a redução de emissões. Para tanto, conta com um setor protagonista no movimento de descarbonização: o segmento de biocombustíveis, cujas contribuições, em conjunto com as da indústria automobilística, irão auxiliar o país no atingimento das metas assumidas em direção a uma economia de baixo carbono. Este foi o tema do webinar produzido pelo Instituto Brasileiro de Petróleo e Gás (IBP), em parceria com a agência epbr, na quarta-feira (21/7).
É preciso entender as particularidades e a vocação de cada país e levar em consideração que os caminhos da transição energética ocorrem de forma diferente nos países, segundo Valéria Lima, diretora executiva de Downstream do IBP. “Comparativamente a outros países, o Brasil está bem posicionado com 48% da sua matriz energética renovável. Mas há muito trabalho a ser feito para a descarbonização, especialmente na matriz de transporte, predominantemente rodoviária. Este setor de transporte está entre os que representam um desafio para a descarbonização, ou na terminologia em inglês – hard to abate sectors e que demandarão mais investimento em inovação”, destacou a executiva.
A diretora acredita que o cenário mais provável que se desenha na transição é a formação de matrizes energéticas regionais adequadas às necessidades locais, como no caso do Brasil, que tem um mercado de biocombustíveis consolidado, sendo o segundo maior produtor mundial.
“Acredito que ainda é cedo para assumir que o carro elétrico irá substituir totalmente os veículos tradicionais. Podemos prever uma cauda mais longa de motores a combustão no Brasil, devido ao protagonismo do país nos biocombustíveis”, ressaltou Valéria Lima.
A diretora chamou atenção também para o forte dinamismo do setor de etanol com grandes investimentos em inovações tecnológicas, como o etanol de 2º geração – que já é uma realidade – e promove o máximo aproveitamento dos subprodutos da cana e maior eficiência na produção, além dos estudos para avaliar o papel deste produto na geração do hidrogênio verde.
No entanto, diz Valéria Lima, este movimento ainda está para acontecer no ciclo diesel sendo importante avançarmos também com uma nova geração de renováveis, com ciclo de vida mais eficiente e que atendem aos padrões ambientais cada vez mais rígidos e à motores mais modernos.
Já Sandro Barreto, gerente geral de marketing da Petrobras, destacou a necessidade da companhia e dos novos players do refino aproveitarem da melhor forma as refinarias do país no processamento de novos biocombustíveis. “Com o desinvestimento [do refino] teremos outros atores que olharão esse hardware [refinaria] e tentarão otimizar seus ativos, a fim de garantir a sua longevidade. Isto passa pela avaliação de alternativas para maior flexibilidade na produção, incluindo o coprocessamento de biomassa renovável [de biocombustível] ou outro processo”, enfatizou Barreto.
O executivo aponta que as políticas públicas, sobretudo o Renovabio, serão importantes para o desenvolvimento dos biocombustíveis avançados, destacando que a possibilidade de emissão e comercialização de créditos CBios estimulará o desenvolvimento deste mercado. Além disso, destaca a importância do enquadramento das novas rotas tecnológicas no mandato compulsório de mistura de renovável no ciclo diesel, permitindo a competição entre os diferentes produtos e garantindo mais opções ao consumidor final.
Com o olhar de quem conhece as diferentes cadeias produtivas globais na produção de veículos automotivos, Henry Joseph, diretor técnico da Anfavea, ressaltou a necessidade de construir o modelo de transporte brasileiro com características próprias. “Se começarmos a querer adotar um cardápio importado, não será a melhor opção para o país”, afirmou Joseph.
Para o executivo, o crescimento do mercado de carros elétricos na Europa ocorre por necessidades próprias, seja por incentivo público ou ainda por produção insuficiente de biocombustíveis.
Na sua visão, a realidade brasileira é “um pouco distante” desse paradigma. Segundo Joseph, o potencial produtivo de combustíveis renováveis e programas como Renovabio e Combustível do Futuro são provas da vocação do país, que deve cada vez mais aprimorar suas expertises, fazendo assim coexistir modelos flex ou híbridos em harmonia com os veículos elétricos.
A diretora do IBP compartilhou também a visão da convivência pacífica e harmônica entre os diferentes tipos de combustíveis, em razão da parcela de descarbonização que os bios trazem para o mercado de derivados. “A política pública tem feito o endereçamento correto da questão: impulso ao desenvolvimento tecnológico e à inovação, visando a consolidar a base tecnológica e aumentar a competitividade dos biocombustíveis na matriz energética nacional. Precisamos prosseguir nesta direção e garantir previsibilidade ao setor para que novos investimentos sejam aportados no país”, ressaltou Valéria Lima.
O gerente da Petrobras disse ainda que a empresa possui planos de modernização das unidades de refino, avalia todo o ciclo de vida do produto no processo de descarbonização e investe em novos produtos e tecnologias. “Temos uma gasolina mais eficiente, com menor emissão de CO2, e estamos com o programa de biorrefino. Além disso, olhamos a produção de HVO – em sigla em inglês Hydroted Vegetal Oil. Trata-se do produto de hidrogenação de óleos vegetais, de gorduras animais e resíduos, como óleo de cozinha usado. Esta tecnologia produz um produto que pode ser fundido ao óleo fóssil e, portanto, utilizado em qualquer proporção”, afirmou Barreto. Pelo mesmo processo produtivo podem também ser fabricados biocombustíveis para aviação, como BioQAv, o que contribui para redução dos custos de produção de ambos os produtos. “Temos que estar atentos também para a aviação, e estarmos prontos para atender os mandatos e acordos internacionais para descarbonização deste setor”, concluiu o executivo.
O representante da Anfavea ressaltou que o segmento de transporte pesado requer atenção, já que, por ele, passa grande parte da movimentação de carga e de pessoas no país. Porém, enxerga inúmeras possibilidades no futuro. “Estamos vendo caminhões elétricos brasileiros sendo fabricados, temos os ônibus também. Há ainda a opção do gás natural e, por fim, a entrada do HVO que, sem dúvida, é um avanço”, concluiu Joseph.
Assista à transmissão na íntegra: