O que são cidades inteligentes e como alcançar um futuro mais tecnológico e sustentável para o espaço urbano? Esse questionamento motivou o lançamento pelo Instituto Brasileiro de Petróleo e Gás (IBP) da série de webinares “Smart and Sustainable Cities: Diálogos sobre Transição Energética & Transformação Digital”, que teve sua estreia neste dia 01/09, às 18h.
O evento online e gratuito contou com moderação de Cristina Pinho (Secretária Geral do IBP) e painéis que giraram em torno das dimensões econômicas do tema: “Qualidade dos serviços básicos e o potencial no Brasil para as smart cities”, apresentado por Guilherme Corrêa (Coordenador de Inovação Tecnológica e Produtiva do Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovações/MCTI); “O papel das fontes de transição energética no planejamento das cidades até 2030”, com Heloísa Borges (Diretora de O&G da Empresa de Pesquisa Energética/EPE); e “Produtividade sustentável: como a indústria de O&G está se planejando para 2030”, com Pietro Mendes (Assessor do Diretor Geral da Agência Nacional de Petróleo, Gás e Biocombustíveis/ANP).
Na abertura, Cristina Pinho contextualizou o tema e destacou o foco do debate no pilar econômico, como a atração de investimentos para o setor de energia e para as cidades inteligentes: “A transição energética e a digital são movimentos muito fortes, que estão na pauta de governos, empresas e sociedade, e dos quais não podemos escapar mais. Eles têm em comum a busca pela melhoria da qualidade de vida do ponto de vista econômico, social, da geração de emprego, do uso de recursos ambientais, da resiliência da infraestrutura de produção e geração de energia. E forte impacto em segurança, saúde, mobilidade urbana”.
Para a moderadora, as empresas terão desafios de recriar seus modelos, como a utilização do gás natural para transporte marítimo, urbano, produção de energia elétrica, geração distribuída e produção de biocombustíveis. “Como os órgãos públicos fomentadores de políticas e regulação veem as estratégias de investimentos e o portfólio de ativos da cadeia de O&G no Brasil, das futuras empresas de energia, para participar dessa transformação da sociedade?”.
Guilherme Corrêa, do MCTI, falou sobre o potencial dos investimentos em tecnologias de transformação digital – principalmente em Internet das Coisas (IoT), mas também em Inteligência Artificial (AI), big data & analytics, robótica, segurança da informação e blockchain, entre outros – na qualidade de serviços básicos. Entre 2019 e 2022, o Ministério estima um total de investimentos de R$ 345,5 bilhões no país, com uma taxa de crescimento de 19,3% ao ano. Ele destacou o Plano Nacional de IoT coordenado pelo Ministério e dividido em quatro eixos (cidades, agronegócio, indústria e saúde), com ações transversais. “Hoje 85% da população no Brasil vivem nas cidades, o que trouxe grandes desafios. A adoção de tecnologias e práticas podem viabilizar a gestão integrada dos serviços para o cidadão, incluindo a mobilidade, segurança e gestão de recursos”, explicou.
Segundo Heloísa Borges, da EPE, a produtividade sustentável é um tema essencial, oportuno e interligado aos demais. E também passa pela forma como a indústria de óleo, gás e biocombustíveis se prepara para reavaliar suas estratégias de portfólios e de investimento e se manter ativa nas próximas décadas. Ela mostrou como a organização contribui para formular, implementar e avaliar políticas energéticas no país e como a própria definição de smart suntainable cities se insere no cenário de transição energética para uma economia de baixo carbono, com a preocupação de garantir serviços urbanos mais eficientes e o atendimento às necessidades econômicas, ambientais e socioculturais da população. “Essas cidades irão otimizar o consumo de energia e exigir novas abordagens das empresas, com investimentos em novas fontes e processos. Os desafios da transição energética não são apenas sobre energia ou eletrificação, a indústria precisa ser ainda mais inovadora, resiliente, conectada e integrada”, prosseguiu Heloísa, que também falou sobre biocombustíveis, mobilidade e outros assuntos.
Em sua fala, Pietro Mendes (ANP) se estendeu sobre as estratégias da indústria de óleo e gás para as cidades inteligentes e os cenários da transição para um futuro mais sustentável, lembrando que os combustíveis fósseis ainda terão um papel importante na segurança energética, a começar pelos desafios da renovação dos transportes. “Precisamos continuar investindo em eficiência energética, tanto na produção de petróleo e gás natural, para reduzir sua pegada de carbono; quanto no desenvolvimento dos motores a combustão interna, pois alguns setores – aviação, transporte marítimo, de cargas – terão maiores dificuldades em fazer a eletrificação”.
Ao mesmo tempo, ele deu vários exemplos de empresas com projetos de geração de energia eólica, solar, de hidrogênio ou com base em biocombustíveis, e até de atendimento direto ao consumidor, com a compra de pontos de recarga de veículos elétricos. Mas destacou que o gás natural ainda é considerado o primeiro passo para essas empresas integradas, devido ao problema de intermitência de outros modelos renováveis e do custo de armazenamento de energia. “Num projeto integrado de transição energética, o gás funciona como backup de forma muito efetiva. Várias empresas já assumiram o compromisso de serem neutras em carbono a partir de 2050. Hoje você tem fundos que exigem as melhores práticas de ESG ((sigla em inglês para Ambiental, Social e Governança) e que pressionam por regulações sobre transição de carbono, baseadas em dados objetivos e auditáveis”, citando também o arcabouço regulatório no Brasil e iniciativas como o Renovabio, com foco em neutralidade tecnológica e melhores soluções e metas para cada realidade e país.
Sobre exemplos de municípios brasileiros que caminham para serem “inteligentes” e os desafios para financiar essa evolução, o representante do MCTI citou o Rio de Janeiro, que criou, de forma pioneira, um centro integrado de operação e controle (COR – Centro de Operações Rio). “Mais importante que o uso da tecnologia, é importante que a cidade seja sustentável”, frisou Guilherme Corrêa.
Perguntado sobre programas que estimulem indústria de O&G no Brasil a buscar a descarbonização de suas atividades, além do Renovabio, Pietro Mendes destacou a relevância de estudos sobre o aumento de custo de capital para indústrias intensivas em carbono, pressão de investidores, e como as soluções de mercado podem ser mais efetivas que uma decisão de governo. “Temos uma incerteza sobre quando a transição energética vai acontecer e como será o mix no futuro. Mas também pressões sociais na tomada de decisões, numa indústria de players globalizados, e o Brasil não tem muito como fugir desse movimento. Sem falar no risco potencial dos stranded assets, da baixa de ativos por regulações de ESG”.
Considerar o ciclo de vida total das iniciativas, no planejamento da EPE, foi o tema da resposta de Heloísa Borges a uma questão recebida pelo chat. “A gente também considera nos nossos modelos, como o PDE 2030 e o Plano Nacional de Energia 2050 (em consulta pública), os ganhos de eficiência energética, até para atribuir as notas a cada empresa”.
O estímulo ao desenvolvimento do 5G no Brasil foi outro tema tratado por Guilherme Corrêa. Para ele, a despeito de este ser um importante viabilizador do uso das ferramentas de IoT, há setores que não dependem desse salto tecnológico, como o agronegócio. “A Anatel vem conduzindo discussões internas e com a iniciativa privada na tentativa de criar toda a agenda e as questões regulatórias. O leilão do espectro para as operadoras deve ocorrer em 2021”.
Nesse ponto, Cristina Pinho lembrou que o Grupo de Trabalho 5G do IBP está trabalhando com empresas operadoras e de downstream, além de outros convidados, para monitorar a licitação e a aplicação da questão. “É importante que a indústria tenha uma participação importante nessa banda, é uma oportunidade de trazer mais rapidez à tomada de decisão, inteligência, sensoriamento e eficiência na logística, na produtividade, um volume de dados que faz uma diferença grande”.
Ainda no contexto das cidades inteligentes, a segurança cibernética – e a proteção de dados – foi o tema seguinte do painel virtual, em meio à fragilização dos ambientes de trabalho em home office trazida pela pandemia do covid-19, após a recente aprovação da nova Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD) e na visão de representantes de organizações que lidam com informações públicas e de empresas, num trade off entre transparência e confidencialidade de informações concorrenciais potencialmente críticas. Em resumo, é preciso garantir acesso aos dados, que permita inovação e avanço do conhecimento, mas garantindo a proteção.
E para finalizar, os palestrantes expuseram suas visões sobre as mudanças na rotina das megacidades inteligentes com a crise do vírus, incluindo soluções de mobilidade e deslocamento, serviços, na saúde, e os reflexos desse aprendizado na mudança do comportamento, com foco cada vez maior no desenvolvimento sustentável, no uso de fontes energéticas limpas, na infraestrutura de conectividade e inclusão digital. “Como isso impacta nossas estratégias? O acesso à energia passa a ser cada vez mais fundamental, para não agravar as disparidades sociais. A perspectiva de que isso possa se repetir tende a acelerar o processo de mudança”, afirmou Heloísa Borges.
Outros dois encontros da série “Smart and Sustainable Cities: Diálogos sobre Transição Energética & Transformação Digital” já estão programadas para os dias 08 e 15/09, quando serão debatidos os pilares ambiental, social e cultural do tema.